Lei sobre animais em SC e a autonomia dos condomínios

Em nosso modelo social neoliberal, o Estado deve intervir o mínimo possível na esfera do particular e considerar o princípio da autonomia privada como fator de maior relevância nas relações entre os particulares, especialmente no que envolve o direito de propriedade.
O Estado, nesta dinâmica neoliberal, deve intervir apenas quando restar constatada alguma distopia capaz de desregular o seio social.
Na espécie, os condomínios são ambientes iminentemente privados, posto que suas áreas comuns pertencem aos titulares de suas respectivas unidades autônomas na medida de suas frações ideais.
O assunto animais em condomínio sempre foi um tema extremamente polêmico, a ponto de ser considerado um dos 5 "C's" problemáticos no quotidiano condominial, quais sejam: Cachorro, Cano, Criança, Carro e Calote.
A polêmica reside no fato de que, por quase 100 anos vivemos sob a égide do Código Civil de 1916, cuja matriz de pensamento era iminentemente liberal e considerava o princípio da autonomia da vontade em seu grau máximo junto aos ambientes particulares assim como são os condomínios edilícios.
Essa matriz liberal concedia a autonomia para que os condomínios, desde que regulamentado em seus regimentos internos, proibissem a presença de animais em suas dependências, inclusive nas áreas privativas.
O tema começou a ser levado ao judiciário em inúmeras oportunidades e no início dos anos 2000 o entendimento passou a ser o de que os condomínios edilícios, ainda que constasse nos seus regulamentos internos, não poderia proibir a presença de animais nas unidades autônomas.
Após isso, a discussão debruçou-se em como os pets, que não mais poderiam ser impedidos de estar no condomínio, circularam pelas áreas comuns da edificação. Neste ponto, várias formas de realizar essa atividade foram pensadas e passaram a constar dos respectivos regulamentos internos. Exemplos: conduzir o pet no colo; conduzir o pet em um carrinho próprio para tal finalidade; conduzir o pet por um perímetro pré-estabelecido pelo solo, da porta da unidade autônoma até o passeio público.
Dada a polêmica, estas medidas não foram suficientes para que a discussão abandonasse o judiciário.
Foi então que, em 22.09.2021, o Legislativo catarinense inovou e concebeu a Lei Estadual 18.215, que dispõe sobre a habitação e o trânsito dos animais domésticos nos condomínios edilícios situados no âmbito territorial do Estado de Santa Catarina.
Esta Lei possibilita que os animais domésticos habitem os condomínios edilícios e garante a livre circulação dos mesmos pelas áreas comuns das edificações.
Na prática, a fim de que não reste caracterizada a prática do crime de constrangimento ilegal pelos síndicos confirme previsto nesta legislação, os condomínios, de modo geral, precisarão alterar os seus regulamentos internos a fim de excluir as disposições que tratam sobre a permanência e o trânsitos dos animais domésticos por suas áreas comuns.
A dispor da Lei 18.215/2021, os condomínios poderão exigir o cadastramento dos pets, assim como a carteira de vacinação dos mesmos e estes não poderão perturbar o sossego, a saúde e a segurança dos demais moradores na exata medida do que trata o artigo 1.336, inciso IV, do Código Civil. Caso o pet faça suas necessidades fisiológicas na área comum, o morador possui o dever de recolher os dejetos e limpar eficazmente a área afetada.
Em contrapartida, os condomínios não mais poderão restringir a área de circulação dos pets, que, desde que, conduzidos na guia e por pessoa capaz de controlar os seus movimentos, poderão percorrer todas as áreas comuns da edificação.
É certo que, a fim de criar um ambiente controlado e harmônico, assim como para constituir as provas do descumprimento das regras relacionadas aos pets, os condôminos recorrerão a metodologias de monitoramento tais como o sistema CFTV, além dos já tradicionais livros de ocorrência.
A Lei 18.215.2021 já está em vigor e demandará uma sensível adequação dos condomínios edilícios situados em Santa Catarina, que atualmente representam 30% dos lares catarinenses.
Gustavo Camacho é advogado, pós-graduado em Direito Processual Civil e Empresarial. Pós-graduado em Direito Imobiliário, Notarial e Urbanístico.
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